

Por que cada vez mais analistas falam em uma “bolha” da inteligência artificial prestes a estourar
Com investimentos bilionários e valuations inflados, cresce o temor de que a euforia em torno da IA esconda riscos semelhantes aos da bolha das “ponto com”.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIALTECNOLOGIA
Por Redação InfoDot
10/16/20254 min read


O cofundador e CEO da OpenAI, Sam Altman, surpreendeu ao responder perguntas de jornalistas durante a conferência DevDay nesta semana, algo raro entre executivos de tecnologia. Em tom de franqueza, Altman reconheceu que há partes do setor de inteligência artificial que “estão meio infladas neste momento”.
“Sei que é tentador escrever uma reportagem falando em bolha”, disse Altman, ao lado de sua equipe, responsável por produtos como o ChatGPT.
A fala reacendeu o debate no Vale do Silício, onde a discussão sobre uma possível supervalorização das empresas de IA vem ganhando força. Analistas e investidores questionam se o salto no valor de mercado dessas companhias é sustentável ou se há um componente de “engenharia financeira” por trás do entusiasmo.
Sinais de alerta
Nos últimos dias, alertas vieram de instituições globais como o Banco da Inglaterra, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o CEO do JP Morgan, Jamie Dimon, que afirmou à BBC que “o nível de incerteza deveria estar mais presente na mente da maioria das pessoas”.
No Vale do Silício, o pioneiro em IA Jerry Kaplan foi direto:
“Já vivi quatro bolhas [...] Quando a bolha estourar, vai ser muito ruim, e não apenas para quem trabalha com IA. Vai arrastar o restante da economia junto.”
Kaplan lembra que o montante em jogo hoje é muito maior do que na bolha das ponto com no fim dos anos 1990. E, desta vez, o impacto pode ser global.
Um mercado trilionário
Segundo estimativas da Gartner, os gastos mundiais com IA devem alcançar US$ 1,5 trilhão até o fim de 2025 (cerca de R$ 8,4 trilhões). Para efeito de comparação, o PIB brasileiro de 2024 foi de R$ 11,7 trilhões.
Empresas ligadas à IA já respondem por 80% dos ganhos da Bolsa americana neste ano, impulsionando gigantes como Nvidia, Microsoft e AMD.
Mas nem todos acreditam que o ritmo é sustentável. A professora Anat Admati, da Stanford Graduate School of Business, lembra que bolhas só podem ser identificadas depois que estouram:
“É muito difícil prever uma bolha. E você não pode afirmar com certeza que estava em uma até que ela tenha estourado”, afirmou.
O emaranhado de acordos bilionários
A OpenAI, epicentro da revolução da IA, está envolvida em uma teia de acordos complexos com grandes players do mercado. Em setembro, firmou um contrato de US$ 100 bilhões com a Nvidia, a empresa mais valiosa do mundo, para construir centros de dados com chips avançados.
Em paralelo, anunciou a compra de equipamentos da rival AMD, em um negócio de bilhões de dólares, que pode torná-la uma das maiores acionistas da fabricante de chips.
A Microsoft é uma das principais investidoras da OpenAI, enquanto a Oracle mantém um contrato de US$ 300 bilhões com a empresa. Há ainda o projeto Stargate, no Texas, apoiado pela Oracle e pelo SoftBank, outro exemplo da interdependência financeira entre as gigantes do setor.
Especialistas alertam que esse tipo de “financiamento circular”, quando uma empresa injeta recursos em seus próprios clientes para manter o ciclo de compras, pode distorcer a real demanda do mercado.
“Sim, os empréstimos de investimento são sem precedentes”, admitiu Altman. “Mas também é sem precedentes empresas crescerem em receita tão rápido.”
Apesar disso, a OpenAI ainda não registrou lucro, um sinal de alerta clássico em períodos de euforia tecnológica.
O peso da infraestrutura
O crescimento acelerado da IA exige uma infraestrutura cada vez mais cara e energética.
No Brasil, há 162 data centers em operação, com capacidade instalada entre 750MW e 800MW, equivalente ao consumo de energia de uma cidade de 2 milhões de habitantes.
Segundo estimativas da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), a demanda prevista para 2038 seria semelhante à de uma metrópole de 43 milhões de habitantes, quase quatro vezes a população da cidade de São Paulo.
Kaplan alerta para um novo tipo de risco:
“Estamos criando um desastre ecológico feito pelo homem: enormes centros de dados em locais remotos, que vão enferrujar e liberar substâncias nocivas ao meio ambiente, sem ninguém para ser responsabilizado, porque construtores e investidores já terão ido embora.”
Entre riscos e esperanças
Apesar dos alertas, há quem veja o lado positivo do excesso de investimento.
“A internet foi construída sobre as cinzas do excesso de investimento na infraestrutura de telecomunicações de ontem”, lembra Jeff Boudier, do hub de IA Hugging Face.
Segundo ele, mesmo que haja uma bolha, a infraestrutura deixada para trás pode impulsionar novas tecnologias e aplicações ainda inimagináveis.
O desafio, agora, é saber quem continuará de pé quando o excesso passar e se o dinheiro para sustentar a corrida pela inteligência artificial não estará, em breve, no limite da realidade.






